Destruição do Património Arqueológico
(Publicado na edição nº 120 do Jornal " Canas de Senhorim")
As últimas semanas foram de perda e desrespeito por uma das nossas maiores riquezas: o Património Arqueológico. No decurso da construção de uma via integrante de loteamento habitacional junto à Escola Eng.º Dionísio Augusto Cunha (antiga quinta do cipreste) por acção de uns, e omissão de outros, foi destruído património que nos pertence a todos, o que deverá motivar o nosso forte protesto e indignação.
O referido património é conhecido pelo nome de “Villa Romana do Fojo” que está inventariado pelo IGESPAR - Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (Anteriormente denominado de IPA), e cujos últimos trabalhos de Relocalização/Identificação ocorreram há cerca de 10 anos.
Ao contrário do previsto na Lei do Património Cultural, o promotor imobiliário ao se deparar com os vestígios arqueológicos no local nem por isso parou com a construção da estrada. Mais grave: como atrás referido, não estávamos perante vestígios arqueológicos desconhecidos que desculpassem a destruição. Muito pior ainda: A entidade licenciadora (Câmara Municipal) ao autorizar a construção da estrada, e conhecedora da existência da “Villa Romana do Fojo”, não só nada fez para parar este “crime” como até lhe deu uma (falsa) aparência legal sobre a forma de licenciamento. As responsabilidades nesta destruição deverão então ser divididas entre a Câmara e o Promotor. A Câmara Municipal de Nelas deveria ser a entidade mais empenhada na defesa deste património, na sua área de jurisdição. Numa publicação denominada “Arqueologia e arte no Concelho de Nelas” da autoria dos conhecidos Professores Maria de Fátima Eusébio e Jorge Adolfo Marques, editada em 2005 pela Câmara Municipal, a “Estação Romana do Fojo” está devidamente identificada (cf. pág. 50). De igual forma, em publicação de 1996, da Junta de Freguesia de Canas de Senhorim, “Canas de Senhorim – História e Património” coordenada pelo nosso conterrâneo Dr. Evaristo Pinto, o espólio em crise está perfeitamente identificado. Então como explicar o licenciamento da construção de uma via neste local? Como justificar que a Câmara Municipal não tenha sequer consultado o IGESPAR para dar um parecer técnico – como a lei obriga - sobre a construção desta via? Estou em crer que, caso não haja má-fé, existe pelo menos muita ignorância e desleixo de pessoas impreparadas para gerirem o património do concelho. Da parte do promotor, e presumindo que a obra está licenciada, deverão ser assacadas responsabilidades ao Director Técnico da Obra que não pode, de ânimo leve, escrever de cruz que o Projecto irá respeitar todas as normas legais e regulamentares aplicáveis e depois permitir esta destruição.
Como era previsível alguns canenses reagiram (substituindo-se, legitimamente, ao poder local cego, mudo e surdo). Pessoalmente sinto-me confortado com a pronta intervenção do IGESPAR que garantiu uma acção de diagnóstico, para avaliar a dimensão e natureza dos contextos afectados, por uma equipa de técnicos especializados, cujos custos serão imputados ao dono da obra. Realço que a resposta do IGESPAR foi imediata. Também foi contactada a Câmara Municipal de Nelas, a quem questionámos o seguinte:
- A obra em questão está licenciada?
-No licenciamento foram salvaguardados os vestígios da villa romana inventariada pelo IGESPAR?
- Estão previstas contrapartidas de salvaguarda por parte do promotor imobiliário? Se sim, para quando?
- Que atitudes irão tomar os serviços da Câmara Municipal no imediato?
- Admite o embargo da obra até que exista plano capaz de salvaguardar este espólio, a expensas do promotor, como prevê a Lei de Bases do Património Cultural?
Na presente data, e mesmo com algumas insistências (duas), ainda não conseguimos obter nenhuma reacção da Câmara Municipal. Esperamos que até à próxima edição tal seja possível pois os cidadãos merecem este esclarecimento ou um “mea culpa” por conduta tão negligente.
Num episódio tão negativo como este espero que pelo menos o nosso infortúnio sirva para despertar os canenses para o dever cívico de proteger o património da sua terra. O património e a cultura podem e dever ser encarados não como algo marginal mas como um “negócio” de futuro, fundamento da nossa identidade colectiva.
Nada de persecutório me move contra Câmara, Construtor ou construção (que se construa, e muito, e já agora com qualidade, na nossa terra) mas é totalmente inqualificável esta preferência por uns metros de alcatrão face a um pedaço da nossa memória colectiva. Se a estrada não se podia desviar então não se devia fazer. Ponto Final.
Nota – Foi na “Villa Romana do Fojo” que o nosso conterrâneo Horácio Peixoto recolheu em prospecção, o famoso “centauro romano”(na imagem), em bronze, pertencente a um objecto de culto romano, e um dos poucos exemplares encontrados em território português.
Manuel Alexandre Henriques
(mahenriques@sapo.pt)
O referido património é conhecido pelo nome de “Villa Romana do Fojo” que está inventariado pelo IGESPAR - Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (Anteriormente denominado de IPA), e cujos últimos trabalhos de Relocalização/Identificação ocorreram há cerca de 10 anos.
Ao contrário do previsto na Lei do Património Cultural, o promotor imobiliário ao se deparar com os vestígios arqueológicos no local nem por isso parou com a construção da estrada. Mais grave: como atrás referido, não estávamos perante vestígios arqueológicos desconhecidos que desculpassem a destruição. Muito pior ainda: A entidade licenciadora (Câmara Municipal) ao autorizar a construção da estrada, e conhecedora da existência da “Villa Romana do Fojo”, não só nada fez para parar este “crime” como até lhe deu uma (falsa) aparência legal sobre a forma de licenciamento. As responsabilidades nesta destruição deverão então ser divididas entre a Câmara e o Promotor. A Câmara Municipal de Nelas deveria ser a entidade mais empenhada na defesa deste património, na sua área de jurisdição. Numa publicação denominada “Arqueologia e arte no Concelho de Nelas” da autoria dos conhecidos Professores Maria de Fátima Eusébio e Jorge Adolfo Marques, editada em 2005 pela Câmara Municipal, a “Estação Romana do Fojo” está devidamente identificada (cf. pág. 50). De igual forma, em publicação de 1996, da Junta de Freguesia de Canas de Senhorim, “Canas de Senhorim – História e Património” coordenada pelo nosso conterrâneo Dr. Evaristo Pinto, o espólio em crise está perfeitamente identificado. Então como explicar o licenciamento da construção de uma via neste local? Como justificar que a Câmara Municipal não tenha sequer consultado o IGESPAR para dar um parecer técnico – como a lei obriga - sobre a construção desta via? Estou em crer que, caso não haja má-fé, existe pelo menos muita ignorância e desleixo de pessoas impreparadas para gerirem o património do concelho. Da parte do promotor, e presumindo que a obra está licenciada, deverão ser assacadas responsabilidades ao Director Técnico da Obra que não pode, de ânimo leve, escrever de cruz que o Projecto irá respeitar todas as normas legais e regulamentares aplicáveis e depois permitir esta destruição.
Como era previsível alguns canenses reagiram (substituindo-se, legitimamente, ao poder local cego, mudo e surdo). Pessoalmente sinto-me confortado com a pronta intervenção do IGESPAR que garantiu uma acção de diagnóstico, para avaliar a dimensão e natureza dos contextos afectados, por uma equipa de técnicos especializados, cujos custos serão imputados ao dono da obra. Realço que a resposta do IGESPAR foi imediata. Também foi contactada a Câmara Municipal de Nelas, a quem questionámos o seguinte:
- A obra em questão está licenciada?
-No licenciamento foram salvaguardados os vestígios da villa romana inventariada pelo IGESPAR?
- Estão previstas contrapartidas de salvaguarda por parte do promotor imobiliário? Se sim, para quando?
- Que atitudes irão tomar os serviços da Câmara Municipal no imediato?
- Admite o embargo da obra até que exista plano capaz de salvaguardar este espólio, a expensas do promotor, como prevê a Lei de Bases do Património Cultural?
Na presente data, e mesmo com algumas insistências (duas), ainda não conseguimos obter nenhuma reacção da Câmara Municipal. Esperamos que até à próxima edição tal seja possível pois os cidadãos merecem este esclarecimento ou um “mea culpa” por conduta tão negligente.
Num episódio tão negativo como este espero que pelo menos o nosso infortúnio sirva para despertar os canenses para o dever cívico de proteger o património da sua terra. O património e a cultura podem e dever ser encarados não como algo marginal mas como um “negócio” de futuro, fundamento da nossa identidade colectiva.
Nada de persecutório me move contra Câmara, Construtor ou construção (que se construa, e muito, e já agora com qualidade, na nossa terra) mas é totalmente inqualificável esta preferência por uns metros de alcatrão face a um pedaço da nossa memória colectiva. Se a estrada não se podia desviar então não se devia fazer. Ponto Final.
Nota – Foi na “Villa Romana do Fojo” que o nosso conterrâneo Horácio Peixoto recolheu em prospecção, o famoso “centauro romano”(na imagem), em bronze, pertencente a um objecto de culto romano, e um dos poucos exemplares encontrados em território português.
Manuel Alexandre Henriques
(mahenriques@sapo.pt)
1 comentário:
ibotter
Você é prova que de facto existe uma "mão invisivel".
Um abraço
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