Canas OnLine

02/12/2008

Entrevista[s]

Dois homens, duas sensibilidades, um objectivo. Não gosto de falar do que faço ou escrevo, bem ou mal, para isso estão os leitores e comentadores, mas desta vez vou abrir uma excepção. As entrevistas eram para sair individualmente, como é hábito, como é normal, como é usual. Decidi juntá-las para melhor as saborearem. As sensibilidades de dois condutores de futuros homens merecem ser juntas, não só pelas respostas mas principalmente pelo conteúdo e trabalho realizado. Tenho o privilégio de os acompanhar de perto e é de enaltecer o seu trabalho, a sua entrega e disponibilidade. Uma palavra também para os atletas que sabem ouvir quando têm que ouvir e falar quando necessário. Não nascemos homens, fazemo-nos, e com a ajuda destes homens os “putos” estão no bom caminho.

1 – Ano novo, vida nova. Que projectos e ambições para esta época em relação á equipa que orienta?


    Paulo Dias - Os projectos estão desde sempre traçados, quem pensa trabalhar com crianças com estas faixas etárias, tem que ter bem presente que o seu desenvolvimento físico tem que ser acompanhado pelo desenvolvimento intelectual e social, é certo que as vitórias são muito importantes, mas mais importante ainda é a sua dedicação à escola, é fundamental que os atletas tenham um comportamento equilibrado entre a sua prestação escolar e desportiva.
    Esta actividade pode dar às crianças um complemento muito importante para a sua vida, nesta sociedade moderna cada vez mais existe a necessidade de trabalhar em conjunto, o desporto colectivo isso proporciona;
    O gosto pelo futebol e principalmente pelo GDR, é uma batalha completamente ganha, estas crianças aderiram de corpo e alma ao projecto.
    Este projecto tem perto de 3 anos, as crianças que nos chegaram pela primeira vez aos treinos não conheciam a cor da camisola, o símbolo, o próprio estádio. Com o decorrer dos anos, passaram a gostar e a defender o GDR como qualquer um de nós. Por esta perspectiva (quanto a mim a mais importante) os projectos estão bastante conseguidos, cada vez existem mais crianças nos variados escalões e que “rebocam” também familiares que estavam completamente desligados do clube.
    O amor à terra, ao clube e ao desporto é um factor que está sempre presente nos nossos objectivos, está e continuará a estar dentro do nosso projecto.
    No entanto as ambições também passam por lutar pela vitória em todos jogos que são disputados. Estas são bastante importantes, dão auto-estima quer às crianças quer a quem com elas trabalha. Quando as derrotas surgem analisamos em conjunto o porquê. Como sabemos, durante a nossa vida perdemos mais do que aquilo que ganhamos, logo estamos a preparar o futuro, estamos a aprender a perder, porque ganhar toda a gente sabe.
    João Marques - Quando se começa a trabalhar com pequeninos o objectivo principal é, na minha modesta opinião, apenas vê-los progredir como jogadores. Em consequência disso, os resultados serão sempre melhores e é isso que pretendo para esta época: melhores resultados e exibições do que na anterior e temo-lo conseguido.


    2 – Muito criticada na época passada em relação às camadas jovens, o que espera desta nova direcção do GDR Canas de Senhorim a nível de apoio e infra-estruturas?

      Paulo Dias
      - Penso que todo o apoio é sempre bem-vindo. Apesar de termos sempre por perto um director que está directamente ligado à direcção, as próprias crianças comentam que “ não sabem quem é que manda no Desportivo”.
      O Desportivo deveria ser mais a arrojado em relação à formação, não me refiro só ao futebol mas também a outros desportos. As crianças são o futuro da nossa terra, no entanto tudo isto dá muito trabalho, sendo por vezes difícil arranjar alguém que esteja disposto a ajudar.
      Sem dúvida que gostaria de proporcionar mais momentos de convívio entre todos os elementos da equipa, gostaria que todos almoçassem juntos pelo menos uma vez por mês, no entanto tenho consciência que tal é impossível, ficaria muito dispendioso para o clube.
      Ao nível das infra-estruturas e apesar de existirem 2 campos existe colisão de horários no campo pelado em vários escalões.
      A boa vontade, o gosto de ensinar, e a paixão pelo futebol fazem com que tudo seja resolvido com bom senso.
      João Marques - Na história mais recente do GDR que vai desde o seu ressurgimento nos finais da década de 60 do século passado até aos dias de hoje, as equipas de formação sempre foram o parente pobre do futebol no Desportivo, excepção às duas ou três épocas em que tivemos efectivamente grandes equipas de juniores em que fomos campeões distritais e disputámos os campeonatos nacionais. E não excluo as minhas responsabilidades pois também fiz parte de algumas direcções fora desse período glorioso.
      É sempre muito difícil a qualquer treinador trabalhar com as condições que nós tivemos num passado recente, sobretudo pela falta de espaços para treinar, e tendo em conta que na época passada havia uma equipa altamente competitiva com pretensões ao título e, em consequência disso, se apoiasse essa em detrimento das restantes.
      Pela minha parte posso dizer que já trabalhei em condições bem piores, em que para iniciar um treino tivemos que ir comprar uma bola, paga por todos, já que não aparecia nenhum director para abrir o balneário.
      Este ano, com as remodelações que houve na direcção penso que o apoio é mais visível, embora se mantenha o problema de falta de espaço para treinar.


      3 – Trabalha na área de formação de novos talentos. Que relação com os jogadores é no seu entender a mais adequada?


        Paulo Dias
        - Sem dúvida que trabalhar com estes escalões não é o mesmo que trabalhar com seniores. É preciso ter alguma compreensão, alguma paciência para compreender as necessidades e dificuldades que por vezes aparecem. A minha formação profissional ajuda bastante, no entanto com o trabalho do dia-a-dia as pessoas apercebem-se disso, têm que ter paciência e gosto de ensinar.
        Já não é o primeiro, segundo e terceiro pai que em conversa refere que não tinha paciência, no entanto alguém teve que ter paciência com eles porque a grande maioria também jogou futebol e fez a sua formação no GDR.
        João Marques - Pessoalmente, procuro fazer exercícios simples e repetidos, não insistindo naqueles que não resultam e tentando, normalmente, pô-los a pensar nos seus erros e na forma de os corrigir.
        ... Mas isto é o que tento fazer...!
        O mais complicado é fazer-lhes ver que não podem jogar todos e que num futuro muito próximo ainda será mais complicado, pois a partir dos iniciados só são permitidas 3 substituições e que estas são definitivas.

        4 – Fala-se sempre da falta de apoio por parte dos pais e do público em geral nos jogos e treinos, principalmente nas camadas jovens. Diz-se até que o apoio do público se baseia apenas nos seniores. Sente o apoio dos pais e do público nos treinos e jogos?

          Paulo Dias
          - O apoio dos pais é uma realidade, todos os anos têm aparecido pais a ajudar naquilo que podem e sabem fazer, no entanto existem outros que nada ajudam.
          A equipa de infantis vai para o seu terceiro ano de trabalho, sem dúvida que durante o primeiro ano (escalão de escolas) foram bastante apoiados pelos familiares, não havia jogo onde não estivessem bastantes pessoas a apoiar a equipa fazendo claque. Com o avançar dos anos essas claques vão rareando, principalmente fora vai diminuindo, a época anterior demonstrou isso.
          Com o apoio ou sem ele o jogo é realizado, os seus intervenientes batem-se sempre até ao último minuto.
          Este ano, no primeiro jogo fora (Vitória em Viseu) a equipa foi bastante apoiada.
          Penso que a "crise" de apoio do público é comum a todos os escalões. Quando posso vou apoiar ao domingo à tarde e vejo com alguma tristeza que os tempos mudaram ou estão a mudar, existem outras ofertas que as pessoas acabam por escolher a que as retira da festa do futebol ao domingo à tarde (que saudades….).
          Penso que se trata de um problema social.
          João Marques - Não concordo com a totalidade da ideia. Os pais tem sido o grande suporte de apoio às equipas dos mais pequenos, com muitas presenças nos treinos e não regateando aplausos até mesmo nas situações mais difíceis e nunca esquecendo o pequeno convívio que se faz no final dos jogos.
          Quanto ao público em geral, olhando para as assistências dos últimos jogos no nosso complexo desportivo, em que os visitantes estão sempre em maioria ou perto disso (ao contrário do que acontece fora) constato que já nem os seniores são apoiados e isso entristece-me.

          5 – Para terminar imagine-se presidente do GDR Canas de Senhorim por um dia. Que medidas e decisões tomaria de imediato?

            Paulo Dias
            - È uma pergunta difícil de responder, olharia mais para os escalões de formação, criaria ou tentaria criar uma actividade para as meninas, que sempre foram tão esquecidas, tentaria formar uma escola de iniciação ao badmington, ou então uma escola de iniciação à patinagem artística e porque não uma escola de iniciação ao andebol.
            É certo que as raparigas também podem jogar futebol e competir nestes escalões com os rapazes, mas penso que ainda existe algum preconceito relativamente a este problema, no entanto ele vai desaparecendo, já não é a primeira vez que em equipas adversárias isso acontece.
            Mas também sei que se alguém apresentar este projecto à direcção do Desportivo esta o apoiará como fez com o nosso.
            João Marques - Se fosse presidente por um dia, pediria às entidades competentes para recuperar o campo da Urgeiriça para o serviço da comunidade e depois de pequenas obras, através de protocolos com a entidade a que o mesmo fosse entregue, passava para ele toda a actividade do futebol de 7 (Infantis e Escolinhas) criando assim melhores condições de trabalho para todas as equipas.
            Depois tentaria perceber a razão porque vai tão pouca gente ao futebol.

            3 comentários:

            jfernandes disse...

            Presto aqui a minha homenagem a estes dois homens e aos que fazem parte da equipa de treinadores. Prestam um grande serviço à comunidade, contribuindo quer na formação de jogadores, quer na formação de pessoas. Infelizmente destes á poucos. Acredito que haverá muita gente com vontade de contribuir, mas por uma ou outra razão, não o fazem. No meu caso, tenho muita pena de não os poder ajudar, por questões meramente profissionais e outras de carácter particular. Ai se eu pudesse!
            Um Bem-Haja para eles.

            PortugaSuave disse...

            Parabéns Paulo Dias e João Marques pelo trabalho notável que tem feito com os kids e pela sensibilidade pedagógico-desportiva que têm demonstrado na relação com eles.
            As vitórias virão naturalmente, mas o mais importante é a dinâmica desportiva que se vai criando.
            Quanto à afluência do público, não é só ao nível local que se reflecte a sua ausência... os estádios de futebol dos grandes clubes estão às moscas. A crise pode ser social mas os agentes de futebol também contribuem para uma certa descrédito da modalidade, factor que acaba por se traduzir na desmotivação dos adeptos. Pode parecer que tal facto não tem repercussão local, ao nível do futebol amador, mas inconscientemente isso afasta muitos dos potenciais simpatizantes do "espectáculo". Como diz o José Marques é um bom desafio de reflexão.
            Cumprim.

            Ps. Ao Efeneto um mto obrigado por mais um excelente trabalho.

            Cingab disse...

            Força aí pessoal