Canas OnLine

27/12/2008

A “ESTÓRIA“ DO TROMBONE

I
CONTINUA EM ADIANTADO ESTADO DE DEGRADAÇÃO A CAPELA DO CEMITERIO

A noite prometia ser fria a contrastar com o ambiente que nos rodeava. O espectáculo de fogo estava quase a romper, as tochas libertavam uma luz e um cheiro característicos de um combustível fóssil, misturado com um sem número de essências vindas dos países mais exóticos do nosso planeta. Os olhos da multidão começavam a afunilar-se para o centro do terreiro, onde a arte de dominar o fogo iria levar-nos a tempos ancestrais dos nossos antepassados. As paredes construídas há séculos serviam de encosto às barracas que davam corpo à frenética empatia entre os promotores culturais e os amantes das coisas boas, feitas com saber e arte. Estas coisas boas eram a companhia desses amantes que o frio da noite não os assustava. Bastava ingerir uma boa poção aquecida do Deus Baco, misturada com mel de alecrim. O espectáculo do fogo estava cada vez mais próximo, a adrenalina dos artistas empurrava-os para a perfeição da sua arte. Enquanto o cerco ao terreiro era cada vez maior, as conversas tornavam-se mais tímidas dada a proximidade de cada um. Num momento, quando a minha conversa se tornou de interesse comum, soltou-se uma voz, muito perto de mim, que a reconheci, não fosse eu um cidadão desta comunidade. Essa voz, que em tempos muito recentes, era veículo de determinadas posições políticas, alicerçadas num determinismo independentista, era calma e triste. Disse-me essa voz, que sempre a considerei amiga: ”Há dias faleceu o meu pai e tive que ser eu e o meu irmão, a compor a terra da sepultura. Triste terra esta que nem sequer tem coveiro”. Depois perguntou-me, com algum receio da minha resposta: “Tu que andas sempre atento, hás-de dizer-me qual é a melhor escolha para a Câmara de Nelas. Na tua opinião qual é pessoa mais competente? Na Dra. Isaura nunca mais vou votar”. A escassos metros do cerco, que apertava o terreiro, estavam sentados alguns autarcas que tinham sido convidados, onde o saber e a política se tiram misturado. A presença destes autarcas em nada influenciou as frases que tinha acabado de ouvir. Fiquei entre a espada e a parede, neste caso, entre o meio do terreiro e a multidão sem saber o que dizer, porque na realidade nunca me passaria pela cabeça ouvir daquela pessoa o que efectivamente ouvi. Quantas vezes, o vi tomado da sua bandeira, como se de uma arma se tratasse. Qual será a dimensão da sua amargura pelo que vê hoje à sua volta? Nessa noite fria, entre o calor humano e o fogo tomei consciência que o povo da minha terra tinha aprendido a lição. Nessa noite fria poder-lhe-ia ter tomado a linha do seu pensamento, não o quis fazer, preferi que a sua consciência decida em consonância com os valores em que foi educado. Em todas as conversas há sempre algo que fica, que aprendemos e nessa noite fria, entre o calor humano e o fogo, guardei na minha memória, o termo “competência. Outras noites não muito distantes, que também fomos marcados, mas negativamente. A esses malabaristas da política temos que os combater com competência, rigor e muito trabalho. Amigos perdidos, empresas falidas, processos pelos excessos praticados, atentados à democracia, vergonhas sentidas, um sem número de coisas que nos colocaram de costas uns para os outros, para agora continuarmos a ser manietados por gente que todos os dias nos enganam. Sim, enganam. As últimas notícias dizem-nos que as obras da capela do cemitério foram outra vez adiadas, por gente que no início de mandato diziam que as pessoas mereciam ter uma morte honrosa. A fotografia mostra uma capela em péssimo estado de conservação, que suspira: “reparem-me, estou farta de esperar”. As últimas notícias revelam-nos que a reparação da Rua Tiago Marques foi trocada pela compra de um trombone. Nós continuamos a esperar e a Junta de Freguesia continua muda, sem marcar comícios na Praça, sem denunciar estes atropelos a esta terra. Só marca comícios para abater os que não fazem parte da estratégia, mas não vamos ter medo dos comícios. É uma forma remota de comunicação. Há uma enorme cumplicidade entre a Câmara e a Junta. Antes, tudo estava mal. Agora continua tudo na mesma, mas ninguém atropela ninguém. Antes as pessoas que iam a Fátima nos autocarros da Câmara chegaram a ser mal tratadas. Hoje vão três autocarros com pessoas para Fátima e as manifestações de revolta não se vêem. Percebe-se perfeitamente porque é que isso acontece. Deixaram de ser injectadas com veneno que demoliu o que de bom possuíamos. Antes colocavam couves em cada buraco que aparecia, hoje abrem e fecham buracos e passam por eles como cães por vinha vindimada.

II

E A REPARAÇÃO DA RUA DR.TIAGO MARQUES FOI TROCADA PELA COMPRA DE UM TROMBONE, NUMA ALTURA ONDE AS FESTAS SÃO EM MAIOR NÚMERO DO QUE AS OBRAS.

Já que a autarquia trocou a reparação da Rua Tiago Marques pela compra de um trombone, em verbas completamente distintas, o que é muito grave, a nossa imaginação vai levar-nos aos tempos em que fomos governados pela monarquia.
Um dia um ilustre Cavaleiro da Casa Real foi mandatado pela Rainha para presidir a um acto de elevado nível cultural. A meio da cerimónia foi confrontado com a brilhante actuação de um músico que agarrado a um trombone deliciou todos os presentes. No final da cerimónia, o ilustre Cavaleiro da Casa Real foi ter com o músico dando-lhe os parabéns pela sua brilhante actuação, mas o excelente músico, muito triste, disse ao ilustre Cavaleiro da Casa Real: “Estou muito triste. Esta é a última vez que toquei neste trombone que foi feito do metal mais puro e pelo melhor artífice do reino”. O ilustre Cavaleiro da Casa Real quis saber o que é que na realidade se estava a passar. O músico, cada vez mais triste, com as lágrimas quase a caírem dos cantos dos olhos, disse: “Ilustre Cavaleiro, vou deixar de tocar com este trombone porque não temos 1.600.000 reis para o pagar”. O ilustre Cavaleiro da Casa Real mal que ouviu as palavras do excelente músico, meteu as mãos à sua bolsa retirando uma mão cheia de moedas, dizendo-lhe: “aceite estas moedas e vá pagar o trombone. O músico ficou extremamente grato e fez uma grande vénia ao ilustre Cavaleiro da Casa Real, dizendo-lhe que não tinha forma de lhe agradecer. Acabada a grande festa com convivas de todas as partes do reino, o ilustre Cavaleiro da Casa Real, regressou na mesma noite, com o propósito de, no dia seguinte reaver o valor que tinha oferecido para o trombone. Afinal tinha feito uma excelente figura, a Casa Real tinha ficado bem representada e ao fim de contas o Tesouro do Reino, pelo valor em causa também não iria ficar numa situação desesperada. Na manhã do outro dia, a sua primeira preocupação foi ir ao serviço do Tesouro do Reino, reaver o valor que tinha dado ao famoso músico para pagar o trombone. Para seu espanto a verba de que precisava já não existia no departamento cultural do reino. Bem, como aquele dinheiro lhe pertencia, acabou por forçar que o valor em causa fosse retirado de uma outra verba do reino, aquela que diz respeito à pavimentação dos caminhos. Feitas as devidas normativas, o ilustre Cavaleiro da Casa Real, deu por concluída a acção benemérita, lembrando-se que quando ouvisse boa música a história do trombone voltaria à sua memória. Os tempos passaram, o inverno estava à porta e um dia o Chefe da Casa Real, ao passar por um determinado caminho, verificou que o seu estado de conservação estava a dificultar a passagem das charretes do reino. Como tal, dirigiu-se ao serviço do Tesouro para lhe ser disponibilizada a verba que já estava programada quando fosse necessário utilizar. Para seu espanto, os serviços do Tesouro disseram-lhe na sua cara, que a verba já tinha sido gasta. O Chefe da Casa Real perguntou: “Mas para onde é que foi o dinheiro?”. A responsável dos Serviços do Tesouro respondeu de imediato: “Foi para a compra de um trombone”. O Chefe da Casa Real, em alta voz declarou: “ Mas quem é que deu ordem para comprar o trombone? Não poder ser. Esse dinheiro era para compor o caminho que dá acesso ao castelo do Dr. Tiago Marques, no povoado de Canas de Senhorim. O barulho foi tanto que os outros serviços do reino durante vários dias não falavam senão da troca do trombone pela reparação de um caminho do reino.
Resumo da “estória”: trocou-se uma rua por um instrumento de música. Mas que se esperava de uns (maus) músicos?


Nota: Este texto foi retirado do "informação socialista/nelas" nº 6 Dez/08

8 comentários:

Pombo correio disse...

Fantastico conto!

Enquadra-se na perfeição ao actual estado de degradação da nossa Terra!

Não me recorda um estado de abandono tão grande como nos ultimos 3 anos!

Para apontar-mos uma coisa que esteja bém em Canas, temos que apontar 50 que estão mal!!!

Triste sina a nossa.

Ana Mafalda disse...

Já conhecia a "estória" mas ainda assim teimava em não acreditar ...

Ainda agora ao relê-la não imagino como fariam obras na Rua Dr. Tiago Marques com 1600 euros, para os passeios dava e sobrava (desde que bem gerido, sem derrapagens nem divisões duvidosas(!))

Aplicarem esse dinheiro num trombone !!!!!!!! é gozarem descaradamente com o povo de Canas, o que mais me doi é um certo silêncio sepulcral ... esta gestão dos dinheiros publicos é incompetente e doentia.

@Pombo correio, também não recordo um mandato assim, devem ter guardado tudo para 2009, para a recolha dos votos, afinal até é uma prática corrente ... revela uma grande falta de criatividade é certo, mas no pensamento de que dirige os nossos destinos lá reina avelha máxima " para quem é bacalhau basta!"

Daniel Monteiro disse...

Não querendo ser chato e andar a lembrar às pessoas o que elas não querem, nem desculpar um erro com outro... não se esqueçam de ir ver http://municipiocds.blogspot.com/2008/12/noticia-do-correio-da-manh.html.

MANUEL HENRIQUES disse...

Só apetece agradecer a quem, para tornar público este caso, colocou a boca no trombone.....

x_ato disse...

A propósito do comentário do Sr. Daniel Monteiro, tomei conhecimento que a Junta de Freguesia de Canas de Senhorim está a conceder empréstimos, é uma medida muito nobre sobretudo nesta época de crise em que estamos a viver.
Também verifiquei que as despesas só podem ser feitas em hotéis, viagens ou restaurantes ...
Pois vem precisamente ao encontro das minhas necessidades, com a crise deixei de viajar, como podem calcular, quem não viaja fica com os horizontes limitados, não vai, não conhece, não vê !!!!
Atrofia-se-lhe o cérebro.
Assim também desejo usufruir de de um empréstimo de 3000 euros, estou convicto que chegará para uma viagem a Inglaterra ... suponho que sem juros????
Excelente.
obg pela informação, tentei contactar por mail com a Junta de Freguesia mas têm a página desactualizada e "morta", compreendo o $ não dará para tudo, tão beneméritos que eles são, muito em breve enviarei o meu pedido por escrito, desde já, pela pertinência da utilização do $ conto com resposta positiva!
Olarilolela!

Cingab disse...

Parece-me que, colocar um artigo de opinião de um jornal de um partido político vai contra os axiomas deste blogue... Mas, tudo bem!...

Como era há 4 anos atrás?
Nem passeios nem trombones, talvez uns pífaros para alguns..

Mal estamos, mas, principalmente quem está no terreno, saberá que já estivemos bastante pior!...

E se o PS se preocupa tanto com os passeios da rua DR. tiago marques, porque não fala dos da Av. dos Bombeiros e tantos outros...

ah!... Pombo correio, permita-me dizer-lhe que, por cada coisa boa, teremos de apontar mais de 100 más, bem mais... é a nossa sina!...

Pombo correio disse...

@Amigo Cingas

Não sei se é hironia da sua parte, mas se quiser posso apontar bém mais de 50 coisas mal, por cada uma que se tenha feito bém!
Aquele abraço.

MANUEL HENRIQUES disse...

@ Cingab

Até o Zé Correia já teve direito a publicidader cá :)

Estou bem distante deste partido. Mas parece-me, à nossa escala, S.M.O, matéria relevante